terça-feira, 31 de março de 2015

o mês

Um livro: O irmão alemão, Chico Buarque
Outro: Trash, Andy Mulligan
Um filme: St. Vincent
Outro: Song One
Mais um: Relatos Selvagens
Um amor: Jorgito


quinta-feira, 26 de março de 2015

as várias caras de Montevideo

Eu acreditei piamente na resposta do recepcionista do hostel quando perguntei se era melhor pegar um ônibus até a Intendencia Municipal, onde começam de fato as atrações turísticas de Montevideo, porque achava meio longe para ir a pé. "Não, é perto", disse ele em bom português de quem morou dois anos adivinha onde? É, em Florianópolis. Então eu fui. E doeu.
























Mas a partir da intendencia as coisas se tornam mais fáceis, e engraçadas, porque você logo dá de cara com a Fuente de los Candados, que fica em uma esquina qualquer no meio da 9 de Julio, principal avenida do centro da cidade. Pronto, ninguém mais precisa ir para Paris com o cadeado no bolso.


Pouco antes de devorar meu segundo - e último - chivito em terras uruguais, dessa vez com direito a papas fritas e huevo duro, terminei de explorar o centro e os primeiro metros da Ciudad Vieja e atendi ao clamor dos meus pés. Na foto, o Palácio Salvo, que é parecidíssimo com o Palácio Barolo, de Buenos Aires, em razão de, veja só, de ter sido obra do mesmo arquiteto, o italiano Mario Palanti.

Chegando mais próximo da Puerta de la Ciudadela, que marca a entrada da Ciudad Vieja, um ambiente meio cinza, bonito e decrépito ao mesmo tempo, passei rapidamente pelo Teatro Solis (note que minhas fotos de monumentos são sempre tortas), ensaiei uma entrada, mas só fiquei ali pela frente ciscando mesmo.

Nos próximos dias tudo ficou mais simples. Com 24 uruguayos e a certeza dada por minha nova amiga Laura, a italiana empolgada, de que os cobradores trocavam notas altas sem fazer beiço, me aventurei pela cidade de colectivo. Assim, deu pra caminhar sem muitas dores só onde interessava na Ciudad Vieja,  pelo peatonal Sarandi, os museus Romantico e Decorativo, almoçar no Mercado del Puerto, comprar dulce de leche e alfajores nas imediações, flanar na rambla Francia, de onde saiu a selfie acima, e ainda ir até Punta Carretas, onde encontrei outra Montevideo. Lá dei uma passada no Punta Carretas Shopping, cujo edifício foi uma penitenciária entre 1910 e 1986, e uma voltinha na rambla, totalmente diferente da rambla da Ciudad Vieja.

Para o dia seguinte ficou uma visita ao bairro de Pocitos e uma preguiça enorme de ir ao Parque Rodó. Assim como Punta Carretas, Pocitos tem uma cara mais arrumadinha, um ar mais chique, ruas arborizadas e silenciosas, uma rambla mais badalada onde as pessoas levam a sério o conceito de praia, e um shopping, o Montevideo, onde entrei para bisbilhotar a Forever 21. É em Pocitos também que fica o letreiro da cidade, esse aí da foto. Não é tão concorrido quando o "I amsterdam", mas precisei esperar uma família sair de cima das letras para fazer o registro. 

terça-feira, 24 de março de 2015

Colônia del Sacramento e o silêncio

Peguei o Buquebus na segunda-feira ao meio-dia e depois de uma hora navegando pelo rio de la Plata, já desembarcava em terras uruguaias. Fui convencida a não usar Colônia del Sacramento apenas como escala para Montevideo e acabei dormindo uma noite por lá, o que estendeu para 24 longas horas que poderia ter sido feito com tranquilidade em três. Mas estamos nessa vida para aprender alguma coisa.































O que acontece em Colônia? Pois bem, vou dizer o que acontece em Colônia. Eu não sei o que se passa no lado não-histórico da cidade, mas creio que isso pouco interessa em desembarca por lá, então naqueles poucos quilômetros quadrados tudo é voltado aos turistas. Para começar, o taxista não ligou o taxímetro e cobrou absurdos 100 pesos uruguaios para andar quatro quadras e, claro, me deixar no lugar errado e eu ter que andar mais três até meu verdadeiro hostel, puxando minha mala pelas ruas de paralelepípedos. Já cheguei bem puta.


Andar pelas ruazinhas de Colônia é legal e estranho ao mesmo tempo porque todas as (poucas) pessoas que estão fazendo isso também são turistas. Essa aí da foto é a Calle de los Supiros e pela quantidade de gente que aparece ali, digo que era a mais movimentada naquela tarde. Todo mundo que circula pelas calles e passeos da cidade está com câmeras no pescoço, mapas na mão, pedindo informações para quem também está atrás de informações. É tão estranho e silencioso que parece uma espécie de museu a céu aberto.























O que não deixa de tornar interessante a experiência de explorar uma cidade de quase 350 anos que foi motivo de luta entre portugueses e espanhóis e que preserva esse passado até hoje. Esse aí é o Portón de Campo, inaugurado em 1745 para servir como entrada oficial da cidade.























Além dos taxistas, quem também adora dar uma mordida  nos turistas são as fofas lojinhas de artesanato e souvenirs camufladas entre as construções antigas. Além de nada ser muito baratinho, elas normalmente fixam um valor mínimo para usar o cartão de crédito ou débito. Assim como os restaurantes.


E não estamos falando de algo equivalente a umas 20 Dilmas, não, não. Mas eu estava morrendo de fome depois de tanto perambular e fui comer meu primeiro chivito, que estava muito bom.

De barriga cheia, fui dar uma voltinha, eu e o timer, pela playa urbana de Rowing, onde de fato havia gente de roupa de banho pegando um solzinho na beira do rio de la Plata. Foi o último destino do dia. À noite fui tomar uma Patrícia, comer uma pizza e uma isla flotante de sobremesa, até ser interrompida por um austríaco sem banho há uns três dias que ficou um total de cinco minutos na minha mesa me fazendo gastar meu inglês precário. 

No outro dia arrastei minha mala até a rodoviária (não recomendo, muita dor) para não dar meu suado dinheiro aos taxistas colonienses, e rumei em uma viagem de duas horas e meia pelos pampas uruguaios até sua capital.

domingo, 22 de março de 2015

Palermo, Recoleta e um coração dividido

Como da outra vez que estive em Buenos Aires fiquei hospedada em San Telmo e consegui explorar um pouco da alma daqueles lados da cidade, dessa vez decidi mirar no combo Palermo-Recoleta. Nada de feira de domingo na Defensa, nada de mercado público, nada de Mafalda. A ideia era se perder sozinha pelas ruas dos dois badalados bairros da Reina del Plata.
Santa Fé, 4.555, em frente a um letreiro piscante da pizzaria Kenutcky, a alguns metros da plaza Itália. Esse foi meu endereço por quatro dias.























Na pira louca de que dormir eu durmo em casa, acabei acordando cedo todos os dias pra aproveitar melhor a luz do dia, já que não sabia o que a noite poderia reservar (e não reservou porra nenhuma anyway), acabei pegando museus como o Malba, o Evita e de Arte Decorativo ainda fechados. Pra não perder também a chance de ver Van Goghs, Manets, Monets, Degas, Toulouse-Lautrecs y otros no Museo Nacional de Bellas Artes, dei um tempinho na plaza Mitre. Uma oportuna ideia, eu diria.


Aliás, na plaza Mitre já era outono uma semana antes.























Logo adiante se torna impossível não entrar no fervo da Recoleta, com a feirinha de artesãos da plaza Francia, o Centro Cultural Recoleta, que estava com duas exposições legais, uma de fotografa e outra de pintura, a Iglesia de Nuestra Señora del Pilar, o Cemitério (que eu pulei porque já tinha visitado na viagem passada) e aquele monte de cafés, heladerias, pubs e restôs que cercam a região. Ali deu para perder umas boas horas do dia e ainda aproveitar o wifi livre.


A igreja de 1732 que dessa vez resolvi espiar por dentro.

Eu, eu mesma e o timer em uma das exposições do Centro Cultural Recoleta.


Milanesa de pollo al horno (porque eu ainda pensava na dieta nessa hora) em El Club de la Milanesa


E um Freddo de postre, ali pertinho.


Um pouco mais adiante, a avenida Alvear e o fino Alvear Palace servem de caminho em direção ao El Ateneo Grand Splendid, na Santa Fé, livraria que eu achei muito mais bonita nas fotos maravilhosas que circulam por aí.


Está sempre lotada. Mais à frente, ainda na infinita Santa Fé, tem também a Bond Street, onde dá para se perder por corredores e mais corredores, níveis e mais níveis de lojas com itens roqueiros, e o Museu dos Beatles, na Corrientes, que por alguma razão estava fechado.


E ainda corri para ver de mais perto o Palacio de Aguas Corrientes, na avenida Córdoba, que é um dos meus prédios favoritos na cidade.

Nos outros dias ainda consegui comer um choripan enquanto flanava no parque Três de Febrero, onde estão o Rosedal e o Jardim Japonês, e pegar a feirinha da plaza Serrano em pleno funcionamento, entre outras pequenas aventuras que nem de longe me fizeram riscar do roteiro tudo o que tem para fazer em Buenos Aires. Tem gente que diz que em quatro dias mata tudo . Pra mim, uns seis meses, quem sabe.

sábado, 7 de março de 2015

buena música pt.7

Ministerio de Energía e seu pequeno (e maravilhoso) filminho B.



*Buena música é uma seção que todo mês apresenta uma banda argentina massa. :)

quarta-feira, 4 de março de 2015

no ônibus

– Me conta a história desse livro.

– Oi?

­– É, me conta a história desse livro aí, nunca li Gabriel Garcia Márquez, mas sempre tive curiosidade.

Com alguma frequência eu ia visitar meus pais no interior, uma viagem curta, feita sem qualquer tipo de trauma em um ônibus limpinho e inteiro que saía em dois horários por dia. Eu sempre comprava a passagem uma semana antes da partida, de modo que escolhia o melhor lugar, na janela, do lado direito. Às vezes alguém sentava ao meu lado, mas estatisticamente fui mais vezes sozinha naquela dupla de poltronas do que acompanhada.
Porém, naquela noite em que cheguei meia hora antes do ônibus na rodoviária devido a um erro de cálculo após mais um dia em meu odioso trabalho, um rapaz sentou ao meu lado. Fazia o tipo nerd desengonçado, cabelos crespos, duas mochilas, uma em cada braço, e um par de óculos de aros grossos enfiados no meio da cara. Eu não teria achado ruim se o dia tivesse sido mais generoso comigo. Mas não. Eu só queria chegar e comer o bolo de cenoura de minha mãe.

– Se importa se eu ligar a luz? – Ele perguntou assim que o ônibus deu a partida.

Eu disse que não, já estava prestes a sacar meu livro da bolsa e continuar a longa leitura de Cem Anos de Solidão, de qualquer modo. Ele estava lendo algum desses contistas brasileiros que pouco me interessam, mas hoje em dia se o cara souber ler já é uma grande coisa.
Foi quando ele pediu para eu contar a história do livro.
Quem é que faz isso? Quero dizer, quem pede para um completo estranho fazer uma resenha oral de um livro de 364 páginas cuja leitura sequer havia sido concluída? Pensei em inventar algo ridículo sobre a incrível história do garotinho órfão que possui um cachorro sem as patas traseiras ou dar na cara dele com o objeto supracitado, mas é o tipo de coisa que só acontece em minha mente doentia. Assim como quando estou dormindo confortavelmente em minha cama num domingo de manhã e algum vizinho imbecil coloca seu aparelho de som no último volume.  Em minha consciência fértil eu me transformo em Xena, a princesa guerreira, só que em tempos modernos, e começo a metralhá-lo sem dó.
Naquela altura, entretanto, eu já estava mais calma. O nariz batatudo do meu chefe já havia saído de minha memória recente e resolvi contar a história do livro ao nobre rapaz. Contei tanto que sugeri a ele ler outro livro do Gabo para matar sua curiosidade acerca do escritor, já que a história desse ele já estava sabendo quase toda.
Como não poderia deixar de ser, minha fala o deixou plenamente à vontade para perguntar tudo sobre a minha vida. Repliquei algumas questões, mas jamais perguntei seu nome. Eu descobriria no dia seguinte, dando uma olhadinha rápida nos portais de notícias locais.
Eu fui a penúltima pessoa que Diego conversou na vida. A última foi o motorista, um agradecimento por deixá-lo descer no meio da estrada, já que o ônibus não entrava na cidade onde iria.

Eram 21h49 quando Diego desceu do ônibus. Eram 21h51 quando Diego achou que seria mais rápido que o caminhão que vinha em sua direção, carregado de tijolos, e conseguiria atravessar a rodovia correndo até a entrada do pequeno município.

sábado, 28 de fevereiro de 2015

o mês

Um livro: Skagboys, Irvine Welsh
Um filme: Temporário 12
Outro: Cake
Um hamburguer: Soul Gourmet
Um grande momento: A entrevista que fiz com a Valesca Popozuda

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Cor de pêssego

Bateu a porta com toda força que tinha naqueles bracinhos finos e prometeu nunca mais voltar. Era a quarta ou quinta vez que Isabel fazia a mesma cena em questão de meses e desta vez nem ousei mover um centímetro de meu corpo confortavelmente soterrado na poltrona verde que ela havia me dado em meu último aniversário.
– Você está fazendo papel de tola – eu disse.
Foi só o que minha boca dormente de tanto uísque barato foi capaz de proferir durante aquela demonstração de fúria, típica de uma adolescente após receber uma negativa do pai ao pedir para colocar um piercing na sobrancelha.
Isabel é praticamente uma adolescente, é verdade. Mas não é minha filha, a filha que eu nunca quis ter, nem quando avançava a porta de saída dos meus 40 anos. Nunca soube definir o que ela era para mim. Eu sabia que gostava de Isabel, sentia um troço que minha execrável ex-mulher jamais conseguiu despertar neste coração de pedra. Fazíamos sexo, ela frequentava minha casa quase que diariamente, às vezes saíamos para fazer coisas de jovens, mas nunca definimos nossa relação. Agora, sentado aqui, tomando o sexto copo dessa porcaria contrabandeada de não sei que buraco, pensei que pudesse ter sido isso.
Ela tenta fazer o tipo durona, diz que não se importa que eu durma com outras, enquanto pinta as unhas dos pés com esmalte preto, mas agora eu sei que não é bem assim.
Teria sido essa arazão do surto psicótico que acabara de suceder no meio da minha sala?
Embora ela soubesse dessa condição há meses e também dormisse com seus garotinhos esquisitos que não passavam dos 50 quilos, parece plausível. Tudo começou porque eu quebrei sua caneca dos Beatles, se não me engano. Estava tão absorto com o jogo do Bayern na televisão que não ouvi direito as primeiras palavras daquela briga.
Vejamos. Isabel entrou aqui há mais ou menos uma hora, veio com um papo estranho de que sua amiga Janaína estava grávida e que teve uma epifania ao acompanhar a moça em uma das consultas médicas. Falava sem parar enquanto eu resmungava alguma coisa indecifrável entre um passe e outro do jogo. Bem, depois disso ela foi para a cozinha e minutos depois começou o escândalo.
Estava lá a caneca – ou que havia sido uma – na lata prateada de lixo. A caneca que ela tinha trazido para tomar café da manhã quando dormia aqui. A caneca que seu irmão lhe deu dois anos antes de ter uma overdose fatal. A caneca suja com batom cor de pêssego que não era dela.